Uma pergunta deve ser respondida com seriedade e honestidade
intelectual: Línguas é evidência física inicial do batismo no Espírito Santo? Busquemos,
então, na própria Bíblia a resposta.
Existem apenas três registros do fenômeno de línguas no
livro de Atos dos Apóstolos. Um detalhe importantíssimo é o cronológico. A
partir do Pentecostes o segundo fenômeno verificou-se mais ou menos sete ou
oito anos depois. E, o terceiro caso de línguas deu-se cerca de vinte anos após
o evento pentecostal. Ou seja, os fenômenos descritos por Lucas compreendem um período de duas décadas no mínimo!
O primeiro caso encontra-se em Atos 2.1-13. No dia de
Pentecostes ocorreu o derramamento do Espírito em cumprimento da profecia de
Joel. Note bem, distinto leitor, que houve fenômenos visíveis e audíveis.
“E de repente veio do céu um som, como de um vento
veemente e impetuoso, e encheu toda a casa em que estavam assentados. E foram
vistas por eles línguas repartidas, como que de fogo, as quais pousaram sobre
cada um deles. E todos foram cheios do Espírito Santo, e começaram a falar
noutras línguas, conforme o Espírito Santo lhes concedia que falassem”
(Atos 2.2-4) – grifo do autor.
O texto é cristalino. Os discípulos foram capacitados pelo Espírito
Santo a falarem em idiomas humanos. É improcedente a ideia de que foi falado ‘línguas
estranhas’. Estas são ininteligíveis. Já as faladas no dia de Pentecostes foram
inteligíveis. A favor desse argumento constata-se que as línguas foram identificadas
e compreendidas (Vs. 6, 8 e 11).
É digno de nota que os discípulos foram tanto batizados no
Espírito quanto cheios do Espírito simultaneamente (Cf. At 1.5,8; 2.4). O
batismo espiritual acontece uma única vez; já a plenitude do Espírito pode ser repetida.
São coisas distintas. Guarde isso em mente.
Geralmente salienta-se que as pessoas após se converterem
precisam buscar o batismo espiritual com a evidência de ‘línguas estranhas’. O
que causa estranhamento é que naquele dia, de Pentecostes, não se falaram
línguas incompreensíveis, ao contrário, foram línguas inteligíveis. Observa-se,
portanto, que não pode associar o fenômeno genuinamente pentecostal com o
hodierno. Se línguas fossem sinal do batismo no Espírito teria que ser línguas estrangeiras.
Ademais, carece de embasamento a ideia de que uns são
batizados no Espírito e, outros não. Segundo o apóstolo Paulo todos são imersos
no Espírito Santo (1 Co 12.13). No texto de Atos supracitado fica claro que todos
foram batizados no Espírito.
Após alistar as nacionalidades presentes no dia de Pentecostes,
segue-se: “todos nós temos ouvido em nossas próprias línguas falar das
grandezas de Deus” (Atos 2.11). De alguma forma as línguas simbolizavam a
universalidade do evangelho. Isto não pode ser ignorado.
O segundo caso de línguas é registrado em Cesaréia. Atentemos:
“E, dizendo Pedro ainda estas palavras, caiu o Espírito Santo sobre todos os
que ouviam a palavra. E os fiéis que eram da circuncisão, todos quantos tinham
vindo com Pedro, maravilharam-se de que o dom do Espírito Santo se derramasse
também sobre os gentios. Porque os ouviam falar línguas, e magnificar a Deus”
(At 10.44-46). Chama-nos a atenção de que Pedro associou esse caso ao ocorrido
cerca de sete ou oito anos atrás, no Pentecostes (Cf. At 11.15,16). Estas línguas
faladas por Cornélio e os de sua casa eram também línguas estrangeiras. Eram inteligíveis
e, consequentemente magnificavam a Deus. As línguas nesse evento explicam-se
pela situação histórica. Os gentios não eram bem quistos. O próprio apóstolo
Pedro apresentou resistência em entrar no lar de um gentio, pois este era
considerado impuro. Todavia, Pedro compreendeu que Deus não faz acepção de
pessoas. Os gentios estavam incluídos no corpo de Cristo, a igreja. A recepção
do dom do Espírito, isto é, o próprio Espírito Santo e a evidência das línguas
estrangeiras dirimiram qualquer dúvida no que tange a inclusão dos gentios.
É significativo que todos os membros da família de
Cornélio receberam o Espírito Santo. Nenhum deles deixou de ser receptáculo do
Espírito Santo. Parece-me que os casos de línguas atuais não estão de acordo com
esse evento específico.
O terceiro e último caso de línguas está em Atos 19.1-7. Em
termo de cronologia nesse evento calcula-se vinte anos a vinte e cinco após o
Pentecostes. Doze homens deslocados no tempo sequer tinham ouvido falar do
Espírito Santo. É curioso que Paulo desconfiou de algo ao perguntar quando
tinham recebido o Espírito. Eles foram batizados em água. Paulo então impôs as
mãos, e veio sobre eles o Espírito Santo; e falavam em línguas, e profetizavam.
Em relação às línguas Lucas não diz que eram diferentes dos registros anteriores.
É interessante que Lucas menciona as línguas [estrangeiras] associadas com
profecia. Ao menos o verso diz que ‘profetizavam’. E, nós sabemos que se dá através da
inteligibilidade.
São apenas três casos de línguas em Atos. Está patente que
nos dois primeiros casos foram na forma de idiomas humanos. E, não tem nada em
contrário no que tange ao último. Caso queiram estabelecer um padrão encontrarão
dificuldade hercúlea ao atrelar ‘línguas estranhas’ nos moldes atuais.
Realmente não tem nada a ver com o fenômeno de línguas em Atos dos apóstolos.
Outra coisa que fica clara que as pessoas e/ou grupos que falaram em línguas jamais
buscaram línguas tampouco o batismo no Espírito Santo. A procura hodierna não
se respalda nos textos analisados. Ficou nítido que a experiência com o
Espírito Santo foi em todos, não em alguns poucos.
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